Artista paraense homenageia Zélia Amador de Deus com grafite em São Paulo
Atualidades
Publicado em 09/11/2024

Foto: Lua Leão

Mina Ribeirinha é a artista por trás da obra "Ananse", selecionada pelo Museu de Arte de Rua da capital paulista

A graffiteira paraense Mina Ribeirinha acaba de trazer para São Paulo um tributo afrofuturista à professora e ativista Zélia Amador de Deus, em um mural de 172 m² intitulado “Ananse Sabedoria Esperteza e Criatividade". A obra foi uma das selecionadas pelo Museu de Arte de Rua (MAR), projeto da Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo, que transforma espaços públicos em galerias a céu aberto, espalhando murais e painéis pelas cinco regiões da cidade.

Inspirada pelo legado de Zélia Amador de Deus, ícone da cultura e militância negra brasileira, Ananse é uma homenagem às "teias de resistência" que unem histórias e saberes ancestrais afro-brasileiros. O mural explora o conceito de oralidade, tecnologias ancestrais e a conexão entre passado e futuro, trazendo em suas cores a força das tradições amazônicas. "É uma homenagem à professora Zélia, uma mulher negra e amazônica que, com sua sabedoria, ajudou a tecer as bases do movimento negro e a conquistar vitórias históricas para a população negra brasileira", afirma Mina Ribeirinha.

O Museu de Arte de Rua (MAR) é um dos mais ambiciosos projetos de arte pública do país, com o objetivo de democratizar o acesso à arte e integrar a diversidade cultural da cidade ao cenário urbano. O projeto prevê a criação de mais de 260 painéis pela cidade, conectando a população com expressões artísticas que desafiam os limites entre arte e espaço urbano.

Zélia Amador de Deus, homenageada na obra, é uma figura central na luta pelos direitos humanos no Brasil, especialmente no combate ao racismo e na valorização da cultura afro-amazônica. Natural de Soure, Marajó, e professora aposentada da Universidade Federal do Pará (UFPA), ela participou da fundação de importantes organizações como a Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos e o Centro de Estudos e Defesa do Negro do Pará (Cedenpa). Entre as conquistas políticas impulsionadas por Zélia estão a criminalização do racismo e a formulação de políticas afirmativas de cotas para pessoas negras nas universidades.

O mural Ananse, está localizado no bairro Jardim Casablanca, na zona sul de São Paulo, e destaca-se pela grandeza de suas dimensões, com 14 metros de altura, e pelo impacto visual das cores e símbolos amazônicos e afro-brasileiros.

 

 

foto: Miguel Godim de Castro

 

Graffiti x Grafite: A Disputa pela Nomenclatura e o Reconhecimento Cultural

O graffiti, forma artística associada ao movimento Hip-Hop, vai além da mera expressão visual: ele é resistência, crítica social e uma manifestação cultural essencialmente urbana. A grafia “graffiti” é preferida por seus praticantes, pois preserva a conexão com a cultura Hip-Hop global e marca uma distinção clara em relação a “grafite”, material utilizado para lápis. Essa disputa pela nomenclatura, ainda vigente no Brasil, evidencia o desejo dos artistas de afirmar sua arte e mantê-la fiel às suas raízes culturais.

Em 2023, o reconhecimento da cultura Hip-Hop como manifestação cultural brasileira pelo governo federal trouxe novo fôlego a essa luta, encaminhando o Hip-Hop para um possível status de patrimônio imaterial. Em outubro, a assinatura da Lei 14.996, de 2024 que reconhece graffiti, charge, caricatura e cartum como expressões da cultura nacional fortaleceu o movimento, destacando a relevância do graffiti como expressão cultural e artística.

A nova legislação representa uma conquista para o graffiti, que por muitos anos enfrentou criminalização e repressão. Esse reconhecimento oficial legitima o graffiti como parte do patrimônio cultural brasileiro, protegendo a liberdade de expressão dos artistas e promovendo a valorização da diversidade cultural do país. Além disso, ao estabelecer essa arte como manifestação cultural, o governo passa a proteger intervenções urbanas, criando um ambiente que promove o desenvolvimento econômico em comunidades marginalizadas e novas oportunidades para os artistas.

O graffiti vai além de transformar paredes, ele ressignifica o ambiente urbano, tecendo diálogos entre diferentes realidades sociais e culturais e convidando a sociedade a refletir. Seja em muros, empenas ou fachadas, o graffiti transforma o espaço público em uma galeria aberta, um verdadeiro museu urbano, onde histórias e perspectivas são compartilhadas, fortalecendo a identidade coletiva e democratizando o acesso à arte.

Mina Ribeirinha

Natural de Belém do Pará, Mina Ribeirinha é graffiteira, artista visual, ilustradora, produtora e arte-educadora com uma carreira que se estende desde 1999. Ao longo de quase 20 anos de trajetória, Mina utiliza o graffiti como um poderoso canal de expressão política e social, abordando questões raciais e celebrando a cultura afro-amazônica por meio de uma perspectiva afrofuturista e afrodiaspórica. Sua arte se conecta profundamente com a militância e o engajamento das comunidades periféricas, centros urbanos e quilombos do Estado do Pará.

Mina também é fundadora e empreendedora da Tinta Preta, a primeira produtora de arte urbana da Amazônia. A Tinta Preta oferece uma gama de produtos e serviços, incluindo moda afro-urbana amazônica, produção executiva de obras públicas de graffiti em diversas dimensões, além de curadoria de artistas locais e nacionais. A artista é uma das criadoras do projeto Bengola em Cores, que transforma o bairro do Benguí, em Belém (PA), em um espaço de arte e cultura, ampliando o acesso à arte urbana e promovendo a valorização das raízes culturais da região.

  "‘Ananse’ é a minha homenagem à professora Zélia Amador de Deus, que está presente nos fluxos dessa grande teia que conecta nossas histórias. O nome da obra é inspirado em uma de suas publicações e carrega o sentido profundo das origens afro-brasileiras que construímos na diáspora. Nossos legados e saberes ancestrais se manifestam em movimentos como a Capoeira, o Hip Hop, as rodas de carimbó e o movimento negro. Zélia teceu essas redes para que, hoje, possamos continuar a criar juntos, sempre em movimento" , diz Mina.

 

Este projeto foi realizado com recursos financeiros do Projeto MAR – Museu de Arte de Rua - Edital nº 08/2024/SMC/CPROG - Secretaria Municipal de Cultura - SP. 

SERVIÇO 

  • Graffiti “Ananse Sabedoria Esperteza e Criatividade" por Mina Ribeirinha

  • Data de finalização da obra: 12 de novembro de 2024.

  • Local: Condomínio Ouro Verde, Rua Luiz Antônio Verney, n• 311 no bairro Jardim Casablanca.

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