Márcia Kambeba, escritora e ativista indígena, contribui com o roteiro da série Cidade Invisível
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Publicado em 08/05/2022

A série Cidade Invisível, criada por Carlos Saldanha, foi lançada em 2021 e arrebatou o público com uma história cheia de mistérios que traz alguns dos seres míticos mais conhecidos do folclore brasileiro. Cuca, Saci Pererê, Curupira, Iara, Tutu Marambá, Boto cor-de-rosa e Corpo Seco são alguns desses personagens que povoam o nosso imaginário e que na série são representados por atores como Alessandra Negrini, que incorpora a Cuca, e por Fábio Lago, o Curupira. 

Para trazer o olhar amazônico para a série, os escritores Daniel Munduruku e Márcia Kambeba foram convidados para contribuir com o roteiro da série. Márcia,  já atuava escrevendo contos sobre a Matinta, o Curupira e demais seres da floresta, que em seus textos surgem para defender a natureza do seu maior agressor: o homem. A escrita da autora, certamente chamou a atenção da equipe de produção da série da Netflix. Conversamos com Marcia Kambeba sobre essa experiência e sobre algumas outras questões. 

Márcia Kambeba, nasceu na aldeia Belém do Alto Solimões no Amazonas, é  graduada e mestra em Geografia e Doutoranda em Estudos Linguísticos pela UFPA. Poeta, escritora com quatro livros lançados e o quinto à caminho, se aventura também pela fotografia. Como atriz participou da minissérie Diário da Floresta do diretor Luiz Arnaldo Campos. Como apresentadora está à frente do programa de entrevistas Amazoniando, disponível no Youtube. Compositora de música indígena e amazônica, contadora de histórias é atualmente Ouvidora Geral do Município de Belém no governo do Prefeito Edmilson Rodrigues.  

"Contribuir com o roteiro de Cidade Invisível cria a oportunidade de mostrar que na Amazônia temos um olhar que não é o de folclore e que a Matinta de fato é um ente que está na vivência de muitos de nós. (...) A série também pode ajudar trazendo discussões sobre o garimpo ilegal na Amazônia. Essa ganância faz com que as pessoas deixem de se sentir intrínsecos à natureza e passem a ver somente com os olhos do capitalismo, levando a autodestruição da vida e da humanidade",  revela Kambeba que não pode dar muitos detalhes sobre a trama da série.  

Por ser mulher, a autora acredita que tem responsabilidade com a Amazônia, e se sente sobretudo feliz e realizada de fazer parte de um  projeto tão grandioso que certamente lhe trará outras oportunidades de trabalho. Sobre isso, Kambeba revela que já está trabalhando num roteiro de um grande espetáculo teatral em SP. Aguardemos!

Como mulher indígena, Marcia Kambeba acredita que os povos originários são os defensores da terra: "Os povos da Amazônia precisam se sentir mais amazônidas para que possam fortalecer essa luta em defesa dessa herança que é nossa. Vivemos numa casa comum. Nós, povos indígenas, sabemos fazer essa casa ser comum, ser partilha, uma presença constante em nossas aldeias. Nossa lição maior vem da natureza na vivência e na contemplação. Ser parente é isso, partilha, união de mundos, saberes partilhados." 

A escritora já tem também novos projetos de livro em seus planos. Um debate que quer trazer em sua próxima publicação é sobre a cidade Mairí Tupinambá. "O que sabemos dessa Mairí que hoje se chama Belém? O que trazemos de representações em nosso ser e quais identidades criamos com essa Mairí Belém ou Belém Mairí? Tudo isso ressoa em mim", nos conta a autora que acredita ser uma missão de seu trabalho ver a interculturalidade se tornando presença e a descolonialidade levando as pessoas a profundas reflexões.

 

Também é possível acompanhar Marcia Kambeba no programa Amazoniando que já está na segunda temnporada e vem com a proposta de falar sobre o Pará, mas também sobre o Brasil. "O Afonso Galindo que é nosso Diretor e roteirista do programa é um excelente profissional e o programa conta com uma equipe maravilhosa da Realize Produções. Estou feliz e me serve como aprendizado essas experiências", comemora a autora. 


Kambeba é muito-talento, é plural, Kambeba é múltipla. É através das pesquisas de múltiplas linguagens que ela trabalha para a visibilidade e valorização dos saberes indígenas, em particular do seu povo, os Omagua/Kambeba, usando as narrativas orais como ferramentas de resistência, do ontem e  de hoje, contra os dispositivos coloniais que oprimem os povos originários. É também contribuindo, com diferentes formas artísticas, que ela imprime a marca da Amazônia no mundo. E essa marca, a gente pode conferir também em Cidade Invisível. 

 

Texto:

Rebecca Braga

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